Beth & Heinz Klein

(Moto)viagens

Diário de bordo -  África 2016

Tour de moto: Zâmbia

Próxima página
Próxima página
15/07
/201
6
-
Sexta-feira
:
Kasane - Livingstone (ZM)

Hoje nos encontramos com o grupo de motociclistas que veio de Cape Town, eles já chegaram em Livingstone ontem.

Mas antes temos que comentar algo que marcou a estadia no hotel de Kasane: já desde o começo da viagem comentávamos entre nõs (o grupo) como o pessoal que nos atende, seja onde for, é extremamente gentil e atencioso. E esse aspecto ficou muito marcado no café da manhã: o garçon que nos atendia perguntou se eu era o aniversariante de dois dias atrás, e com a resposta afirmativa pediu desculpas por não ter estado ali no dia e me ofereceu os cumprimentos atrasados. A gente pode achar que as gentilezas sejam apenas um tratamento cuidadoso dos turistas, mas uma atitude dessas é realmente bonita e marcante.

A viagem até a fronteira Botswana-Zâmbia é bem curta: ela fica a uns 10 km. de Kasane, no rio Chobe.A travessia é feita numa balsa, de modo que os procedimentos de saída e entrada são bem separados: Botswana de um lado e Zâmbia do outro.

A saída de Botswana foi absolutamente tranquila: passaporte carimbado e fomos embora. Sobre a chegada a Zâmbia Jonathan já havia nos advertido que seria trabalhosa, mas que Julian, o motorista da van que acompanhou a turma de Cape Town e agora acompanhará o grupo completo até o fim estaria lá.

A operação foi um pouco complicada porque o pessoal da SAMA Tours queria economizar os custos de atravessar com o carro para transportar as malas. Então Rachel, Beth, Jonathan e Storm atravessaram como pedestres, carregando as malas. O que tornou isso complicado é que o posto de imigração e aduana onde foram feitos os trâmites de entrada fica a uns bons 300 metros da balsa, e eles tiveram que lutar com as malas até nos encontrar nesse posto - Bruce e eu avançamos até ele com as motos.

E aí entrou em ação 'São Julian'! A fronteira de Zâmbia lembra as piores fronteiras da América Latina: uma multidão de facilitadores (runners por aqui) enchendo a paciência para ajudar. E confessamos que provavelmente não teríamos resistido ao assédio se estivéssemos sozinhos: perdemos a conta do número de guichês que tivemos que visitar, só lembramos que tivemos que pagar cinco diferentes taxas, duas em US$ e três em ZMK (Zambia Kwascha, a moeda local).

Felizmente Julian conhecia tão bem o roteiro que num determinado momento ele estava ensinando ao oficial de alfândega como preencher o carnet de passages. Aliás, curiosamente na saída de Botswana, apesar de não ter sido usado, tivemos que mostrá-lo na alfândega. Não sabemos por quê! E esse carnet de passages elimina a burocracia de importação temporária, mas continua-se pagando um monte de taxas para o veículo: tivemos que pagar US$ 20,00 e ZMK 470,00, aproximadamente US$ 50,00). E mesmo com toda a experiência do Julian, ele também contou com um facilitador para ajudá-lo. Complicado!

Graças a essas ajudas levamos 'apenas' 1h30 para completar o processo de ponta a ponta Botswana, balsa e Zâmbia. A saída da alfândega de Zâmbia é uma daquelas aventuras a que os viajantes latino-americanos também estão acostumados: um monte de caminhões parados esperando para fazer os trâmites alfandegários e uma confusão tão grande que só sobra uma pista para os carros (e motos - nós) entrarem e saírem da área.

Mas depois de sair dali foram uns 70 km. de estrada bem razoável até o hotel em Livingstone, onde chegamos lá pelas 11h00. Não havia nenhuma atividade prevista para a tarde, e nos limitamos a almoçar, caminhar até a cidade para trocar os pulas que sobraram de Botswana e aproveitar o ótimo acesso à Internet para resolver as pendências que se acumularam ao longo dos últimos quatro dias.

E também ficamos conhecendo o resto dos viajantes aos quais estamos nos juntando para seguir até Moshi, aos pés do Kilimanjaro. Juntando com os dois casais vindos de Pretoria nosso grupo agora é composto  por:

  • Cinco casais australianos.
  • Um casal brasileiro.
  • Um motociclista australiano solo.
  • Um motociclista norte-americano solo.
  • O guia e dono da SAMA Tours, Darryl.

Um total de nove motos, com faixa etária bastante alta: o/a mais jovem deve estar na faixa dos 50 anos de idade, o mais velho tem 78 anos e outro também já bateu nos 70.

E há ainda um casal de escoceses que veio de Cape Town até aqui mas amanhã retorna para Pretoria, fazendo sozinhos o caminho contrário ao que fizemos para chegar até aqui. Parece ser uma turma agradável, apesar de que a prevalência de uma nacionalidade pode dificultar um pouco a nossa integração.


16/07
/201
6
-
Sábado
:
Livingstone

O programa para hoje girou todo em torno das cataratas Victoria Falls. Incluído no pacote do tour havia um sobrevôo de helicóptero e a visita por terra.

Para o vôo fomos apanhados pela van do operador desses vôos e levados para o aeroporto onde embarcamos no helicóptero. O vôo dura uns quinze minutos, e no caso de Victoria Falls serve muito mais para mostrar o que existe em torno da catarata. Esta fica numa garganta funda (uns 110 metros) e estreita, e com a nuvem de água pulverizada que se ergue da catarata pouco se vê da mesma. Mesmo assim valeu porque a sequencia de gargantas que o rio percorre a partir da catarata é muito bonita, e também a parte de cima do rio é muito interessante de se ver.

De volta ao hotel pegamos as motos e fomos primeiro visitar uma vila nativa (Mukuni Cultural Village) para ver como vive esse pessoal. Não é uma montagem só para turistas, ali vivem realmente 7.000 pessoas, em condições difíceis de acreditar: palhoças de adobe com tetos de palha, em toda a vila há seis ou sete torneiras para prover todos com água e o banheiro continua sendo o matinho. E isso a uns cinco quilômetros de uma cidade com hotéis modernos e de alto nível como o nosso. Um contraste difícil de entender. As crianças da vila gostam de ser fotografadas e até fazem pose. No local há muitas mangueiras cujas frutas além de serem consumidas também são vendidas. Há também árvores de amarula e as pessoas fazem chá da casca para conter diarréias.

De lá fomos para Victoria Falls, e a visita valeu cada minuto da hora que passamos lá. A catarata é muito bonita, e diferentemente de Foz do Iguaçú, quando o fluxo de água é suficientemente alto (hoje estava em 35% do máximo) forma um paredão contínuo de 1700 m. Mas comparar Victoria Falls com Foz do Iguaçú ou Niagara nem faz muito sentido, pois além de cada uma ter sua beleza própria e medidas bem diferentes das outras, até o momento em que se observa pode mudar muito o que se vê. Por exemplo, se tomarmos o fluxo médio anual de água das três, Niagara é a que tem o maior volume, mas o valor máximo é, muito na frente, de Foz do Iguaçú. Mais dados em https://en.wikipedia.org/wiki/Victoria_Falls#Statistics. E acreditamos que apesar do vôo de helicóptero ter valido a pena, diríamos que ele é um complemento à visita terrestre, jamais podendo substituí-la. Durante nossa caminhada vestimos a roupa de chuva da moto para evitar os respingos da água da catarata e além de ficarmos molhados por fora ficamos também molhados de suor, pois essa roupa não respira e do mesmo jeito que impede a entrada de água, impede a saída dela.

Na volta abastecemos a moto no posto ao lado do hotel e passamos o resto do dia descansando e trabalhando neste texto, pois os próximos quatro dias serão de muito tempo de estrada e pouco tempo para qualquer outra coisa: 460 km. amanhã, 560 no dia 18, 130 (ufa!) no dia 19 e 545 no dia 20. Será também a primeira vez que viajaremos com o grupo completo, dez motos incluindo a do guia, Darryl.


17-18/07
/201
6
-
Domingo - Segunda-feira
:
Livingstone - Lusaka - Chipata

Na mesma toada que o Jonathan, os dias com o Darryl começam com café da manhã às 7h00 e partida às 8h00. O dia 16 não foi diferente. Os primeiros 150 km foram bastante tranquilos e confortáveis, e paramos para um descanso e café após pouco mais de uma hora e meia de viagem. O segundo segmento já foi um pouco mais complicado, com mais cidades no caminho, que reduziram um tanto a média de viagem. E vivenciamos pela primeira vez o esquema de almoço que é usado pelo grupo grande: como agora temos uma van grande (realmente grande) como carro de apoio, nelas são carregadas cadeiras de camping dobráveis (muito confortáveis) e lanches preparados no hotel de onde partimos.

Encontra-se uma área na beira da estrada onde caibam as motos e a van + carreta com moto reserva que ela puxa, as cadeiras são abertas e comemos de forma bastante confortável para as circunstâncias num círculo formado com as cadeiras.

Nesse dia o lanche foi uma coxa de galinha e um pedaço de carne bovina acompanhados por salada de batatas e um suco. Perfeitamente satisfatório! Ainda paramos mais um vez para abastecer as motos e esticar um pouco as pernas e iniciamos o terceiro e último segmento da viagem.

E esse foi bem mais difícil: havia 20 km (um trecho de 1 km + outro de 19 km) de terra, com mais da metade cheia de "costelas de vaca" que tornavam a viagem muito desconfortável. Tanto para carros como para motos, a forma mais confortável de andar nesse tipo de pista é em velocidade mais alta, mas quem disse que eu tinha coragem de fazer isso, por medo de perder o controle da moto. A falta de experiência fora do asfalto tornou esse trecho extremamente tenso e cansativo.

E aí, para completar a canseira, entrando em Lusaka, cidade grande e com trânsito típico de qualquer cidade grande, o Darryl conseguiu errar o caminho do hotel e nos levar por um tour imprevisto e nem um pouco benvindo pela cidade. Tudo bem, acontece, mas nosso GPS mostrava direitinho o caminho para o hotel, e aquele bando de motos insistindo em fazer outro caminho.

Mas finalmente chegamos, sujos pela poeira da estrada e bastante cansados. Foi tomar um banho, jantar e apagar para encarar o segundo dia.

No dia 18 a viagem em si foi mais homogênea, mas a própria distância a tornou cansativa. Nenhum trecho foi tão rápido e confortável como o primeiro do dia 17, mas também não enfrentamos trechos de terra. O que prejudica muito o ritmo é a enorme quantidade de vilarejos, e a travessia de cada um deles é marcada por um limite de velocidade de 50 km/h e lombadas que nos obrigam a trafegar em velocidade até inferior a esse limite.

E uma nova experiência nos aguardava quando fizemos a parada para o café: por falta de opção Darryl escolheu um ponto de parada perto de um aglomerado de casas um pouco afastadas da estrada. Foi só pararmos e começarmos a tirar garrafas térmicas e biscoitos da van e fomos literalmente cercados por crianças, dezenas delas. É uma situação muito complicada, porque não temos como oferecer alguma coisa para comer para aquela pequena multidão.

Darryl tinha uma caixa de canetas esferofráficas para distribuir, mas mesmo isso foi complicado: as crianças quase arrancavam a caixa das mãos dele. Beth ainda tentou organizar uma fila, mas por falta de comunicação com o Darryl naquela bagunça também não funcionou. No fim ele encontrou um rapaz mais velho no grupo e entregou a caixa de canetas para ele - eles que se entendessem!

De volta à estrada, os animais, principalmente cabritos e vacas, somam-se aos pedestres e agora também ciclistas à beira da estrada. Esse movimento dá a impressão de que boa parte da população se locomove a pé, seja para ir e voltar do trabalho, da escola ou simplesmente fazer compras.

E algumas imagens do nosso passado que a maioria de nós só conhece de fotografias aqui ainda são realidade cotidiana: mulheres carregando latas de água, trouxas de roupa ou outras coisas equilibradas na cabeça e mulheres com uma espécie de turbante com um laço amarrado na frente. Também a lavoura é totalmente manual, não se vê uma ceifadeira ou colheitadeira em nenhum lugar.

Também se vê um contraste curioso: essas vilas ao longo da estrada aparentam muita pobreza, com lojas todas em construções bastante simples, quase precárias: na absoluta maioria um prédio longo de alvenaria onde cada porta, do tamanho de uma garagem no Brasil, é um negócio. Mas os nomes são absolutamente iguais a qualquer estabelecimento comercial do mundo desenvolvido: People's Choice, Xxxxx General Market, Xxxxxx Shopping Center, Xxxxxxx Investments, e por aí vai.

Chegamos a Chipata cansados mas com tempo para relaxar um pouco, tomar um bom banho e ainda tomar um drinque no bar do hotel antes do jantar. Desde Livingstone estamos em hotéis da cadeia sul-africana Protea, que, como parte do conforto de hotéis 4 estrelas, oferecem acesso decente à Internet. Isso foi muito importante porque tínhamos algumas pendências, inclusive bancárias, que não pudemos deixar inteiramente resolvidas quando saímos do Brasil e que conseguimos deixar razoavelmente encaminhadas.

E para apresentar mais uma novidade oferecida pelo grupo, ganhamos no jantar a responsabilidade de cuidar do mascote do grupo, um meerkat (suricata, uma espécie de furão nativo do deserto de Kalahari, que só existe por aqui) de pelúcia chamado Andy. Esse mascote está e continuará passando de mão em mão ao longo da viagem, e cada um inventa uma história para o tempo que ele passou com a pessoa/casal e para repassá-lo para o próximo.

No nosso caso o Julian disse que ele queria aprender línguas estrangeiras e por isso passaria aos nossos cuidados. Agora temos que achar lugar para o Andy na moto, pois ele tem que viajar e acompanhar o seu 'cuidador' em todas as atividades.

E também sofremos hoje um pequeno desastre: perdemos todas as fotos de Chobe e Victoria Falls (não aceitamos perguntas nem comentários...), certamente dois dos pontos altos da viagem. Vamos ver se conseguimos pegar as fotos do Bruce e da Rachel para tentar recuperar pelo menos algo dessa grande perda.


19/07
/201
6
-
Terça-feira
:
Chipata - Luangwa National Park

Luangwa National Park é onde fica o local onde nos hospedamos hoje, e como não há nenhuma cidade significativa nas redondezas optamos por indicar o parque como destino. A viagem em si foi curta, por estrada normal para a região.

Mas o Darryl tinha uma surpresinha para nós: 4 km de terra para chegar ao Wildlife Camp, nossa hospedagem para essa noite. Fomos mais uma vez lutando com a minha inabilidade nesse tipo de estrada até que o Richard, um dos australianos, caiu na nossa frente num trecho de areia fofa. Felizmente a esposa dele já estava na van, e a Beth foi para lá também. Mas consegui chegar no Wildlife Camp sem cair...

Chegamos lá pelas 11h30, mas o dia não seria de puro descanso: às 15h30 havia um game drive agendado. Niguém pode reclamar que a SAMA Tours não oferece uma programação intensa para as horas paradas!

E observem que evitamos usar a palavra hotel ou lodge para descrever o Wildlife Camp. A razão é que realmente é um tipo de acomodação bem diferente: eles oferecem chalés, mas nós ficamos em barracas incrementadas: são barrracas de lona mas em formato de 'casinha', com portas de ferro com fechaduras, e montadas numa superfície de cimento, com camas de ferro, colchões, etc. Ou seja, bastante confortáveis se o tempo não estiver muito frio - e não estava. E nos fundos da barraca há um outra porta que dá para um banheiro privativo da barraca - pia, vaso sanitário e chuveiro. E tudo isso coberto por um telhado de palha. O único probleminha é que entre o telhado e as paredes do banheiro há um espaço totalmente livre de uns 50 cm. Ou seja, isolamento acústico nulo (mas isso vale para a barraca também, como qualquer pessoa que já fez camping sabe) e dependendo das condilções climáticas um ventinho bem chato para atrapalhar o banho.

E por quê alguém se interessaria por ficar num lugar desses? Algumas razões: de frente para o rio Luangwa, proporcionando a oportunidade de observar hipopótamos, crocodilos e antílopes sentado nas cadeiras da varanda da barraca. Dependendo das oportunidades ver elefantes passando a menos de 50 metros da barraca. Ter acesso fácil a game drives no Luangwa National Park.

E foi um desses que fizemos, com uma novidade em relação aos anteriores: o passeio começou às 16h00 (saímos às 15h30, mas até chegar ao portão do parque e fazer o registro passou meia hora) e durante umas duas horas procuramos pelos animais, com oportunidade de ver elefantes, girafas, leoas, antílopes e outros menores. E depois de uma parada de uns vinte minutos para tomar um drinque e comer pipoca prosseguimos, agora com um auxiliar do motorista varrendo a mata e o campo com uma lanterna.

E, incrível, ele achava um monte de bichos. Mas o grande destaque que fez valer o passeio todo foi termos a oportunidade de ver um leopardo, o mais difícil dos Big 5. Foi um passeio muito legal e voltamos para o Camp lá pelas 20h00. Fomos diretamente para o jantar e dali correndo para a cama: no dia seguinte tínhamos pela frente 500 km de estrada e a passagem da fronteira de Zâmbia para o Malawi. Para viabilizar tudo isso Darryl programou o café da manhã para as 6 horas com partida às 6h30! Aí, ai, ai, essa viagem está saindo uma bela correria...

O curioso é que dormimos relativamente bem, pois temíamos que a barulheira dos hipopótamos logo ali no rio não nos deixasse dormir. Ou eles ficaram quietos ou o cansaço nos impediu de ouví-los.

Página anterior
Página anterior
Diários de Bordo