Beth & Heinz Klein

(Moto)viagens

Diário de bordo -  África 2016

Tour de moto: Malawi

20/07
/201
6
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Quarta-feira
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Luangwa National Park - Chipata - Ngala Beach (MW)

As barracas ficam um pouco distantes do restaurante do Wildlife Camp, e por razões de segurança (risco de encontrar animais grandes) as mulheres foram conduzidas na van e os homens foram já com as motos para lá. Saímos um pouco atrasados porque um pneu da moto do Darryl estava furado - incrível encontrar um prego nessa fim de mundo, numa estrada de terra!

Mas isso foi rapidamente resolvido e tocamos de volta para Chipata - é o único trecho da viagem em que fizemos ida e volta pelo mesmo caminho. Em Chipata abastecemos e seguimos para a fronteira com o Malawi. Processamento sem grandes tropeços, mas para 16 pessoas e dez veículos não há jeito: levamos duas horas para completar toda a burocracia.

A viagem até Ngala Beach, nosso destino de hoje, passou por Lilongwe, capital do país. Como toda passagem por cidade grande, é demorada e um pouco cansativa. E a própria viagem acabou sendo mais longa (distância e tempo) que o originalmente planejado: Darryl optou por alongar a viagem em uns 40 quilômetros para evitar a passagem por um parque pois incluiria trechos em cascalho e risco de encontro com animais grandes em situações de perigo.

Uma impressão muito clara que se tem assim que se entra no Malawi é que a pobreza é um pouco menor que em Botswana e Zâmbia: todas as casas, por mais pobres e isoladas que sejam, são construídas de tijolos, o que já é um avanço. E é interessante observar que em muitos vilarejos os tijolos são cozidos pelos próprios habitantes.

A estrada foi piorando conforme nos aproximávamos de Ngala Beach, e a quantidade de gente no acostamento e nas vilazinhas por onde passávamos era cada vez maior.

Mas chegamos bem a hotel, um lugar muito agradável com quartos gostosos apesar de pedindo uma atualização. Vai ser a primeira vez nessa viagem que dormiremos com mosquiteiro na cama - entramos numa área com malária endêmica.

Os proprietários do hotel são sul-africanos que trabalhavam na Tanzânia e resolveram deixar a vida corporativa e partir para esse empreendimento. E também foi a primeira noite nessa viagem em que o bar e restaurante totalmente abertos não criram nenhuma sensação de frio desconfortável. Realmente estamos 'subindo' para regiões mais quentes.


21/07
/201
6
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Quinta-feira
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Ngala Beach

O Ngala Beach Lodge, onde ficamos hospedados, fica na beira do lago Malawi, um lago muito grande, nono maior do mundo. Pesca é uma atividade econômica importante, pois o lago é muito piscoso. Após o café da manhã fomos conduzidos por um guia local para visitar a vila de pescadores perto do hotel, incluindo uma visita à escola e ao centro de saúde da vila, onde pudemos conversar, respectivamente, com um professor e um dos médicos.

A pobreza é muito grande, e fica uma sensação estranha quando se pensa o que estamos gastando numa viagem dessas e quão pouco essas pessoas têm. Dá a impressão de que com o dinheiro que gastamos com roupas, capacetes e botas para andar de moto esse pessoal conseguiria construir uma das casinhas onde eles moram.

Um aspecto que já havíamos observado no encontro com as crianças na beira da estrada três dias antes foi mais vivenciado aqui: como as crianças 'grudam' na gente. Foi só nos aproximarmos do vilarejo e lá vieram as crianças. Pouco depois cada um do grupo estava de mãos dadas com uma criança de cada lado e outras disputando essas mãos. E as crianças adoram ser fotografadas, ficam fazendo poses e querendo ver as fotos depois de tiradas.

Antes de ir para a escola passamos numa lojinha e compramos cinco cadernos de umas 30-50 folhas para doar para a escola: US$ 1,50. Você pode se perguntar porque não compramos logo cinquenta. Pois é, fica exatamente essa sensação, de um lado estamos dando tão pouco, mas ao mesmo tempo estamos 'na média', é mais ou menos isso que é esperado de nós. Um tanto complicado...

Conversando com o professor ele contou que, como já tivemos (talvez até ainda tenhamos) no Brasil, diversos anos escolares se juntam numa mesma classe. Porém, ao contrário do que conhecíamos do Brasil, aqui essas classes chegam a ter duzentos alunos! Não conseguimos entender (problema de comunicação mesmo, o inglês dos nativos por aqui não é muito fácil de compreender) como é que eles conseguem obter resultados nessas condições.

Outro problema mencionado pelo professor é a questão nutricional: ele disse que muitas crianças vêm para a escola sem ter se alimentado. E na escola não há merenda: elas ficam sem comer durante todo o período escolar e muitas vezes também não terão nada ao voltar para casa...

Mas há gente que ajuda para valer essas pessoas: o guia nos contou de um motociclista alemão que, depois de visitá-los ao longo de uma viagem pessoal, retornou mais tarde para, com auxílio de mais alguns poucos voluntários, construir dois dos pavilhões (duas classes em cada) da escola, com as próprias mãos. A gente se sente pequeno quando vê gestos desse tipo!

A primeira coisa que chamou a atenção ao chegar ao centro de saúde foi o fato de ser o único prédio fechado por uma cerca de arame (daquele que chamamos 'de galinheiro') de uns dois metros de altura. Não quisemos perguntar, mas imaginamos que por armazenar drogas e talvez outros objetos vendáveis seja um alvo prioritário para furtos.

O médico contou que, ao contrário do que imaginávamos, o maior problema deles não é HIV e sim malária: 90% dos casos que tratam. E sem sucesso: ele disse que eles têm medicação eficiente e em quantidade satisfatória, mas como os pacientes não têm mosquiteiros nas casas, acabam sempre sendo picados novamente e voltando com o mesmo problema.

E o trabalho deles não passa muto disso e de partos normais: qualquer coisa mais complicada tem que ser enviada para um hospital a uns 8 km. de distância. Também aqui deixamos uma doação em dinheiro para ajudar um pouco.

Depois dessa visita o resto do dia foi dedicado a descansar no hotel, com parte desse descanso dedicado a escrever este texto. Também aproveitamos para copiar as fotos do Bruce de Chobe e Victoria Falls - por falta de opção copiamos o iPhone inteiro dele, e agora temos que apagar tudo que não nos interessa: significa achar umas 50-100 fotos num total de mais de 10.000. Mais um trabalhinho!


22/07
/201
6
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Sexta-feira
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Ngala Beach - Karonga

Estamos escrevendo de Dar es Salaam, na Tanzânia. Os últimos 3 dias foram muito difíceis, e não houve a menor oportunidade de escrever antes.

O trecho do dia 22 foi basicamente para nos aproximar da fronteira com a Tanzânia, de modo a viabilizar o deslocamento do dia seguinte incluindo os trâmites de imigração e aduana. Foi um trecho um tanto complicado, começando a uns 50 km. depois da partida, onde chegamos a um ponto da estrada interrompido: havia um desvio passando pelo leito de um rio, onde uma ponte havia sido derrubada para construção de uma nova. Imagine descer uma pirambeira de uns 100 metros de areia fofa e depois subir a mesma coisa do outro lado. Primeiro o Darryl teve muita presença de espírito e esperou que três caminhões que haviamos ultrapassado chegassem e passassem: só faltava que um desses malucos decidisse descer aquilo quando nós estivéssemos tentando atravessar.

Aí fomos nós, e a primeira providência foi transferir a Beth, juntamente com outras esposas,  para a van (só uma das mulheres, a Marilyn, acompanhou o Trevor em todas as situações, ela nunca foi para a van. Muito valente!!!). Eu era o último a atravessar, e consegui descer mas não subi: não tenho experência fora-de-estrada, e particularmente areia é onde me perco totalmente. Parei a moto, desci e pedi ao Darryl que a levasse até em cima - fui andando.

Em seguida pegamos um trecho de estrada estreita, sinuosa e com muitos caminhões, e no fim dela paramos num shopping center de uma cidade por onde passamos (nem guardamos o nome) para alguns dos companheiros de viagem comprarem adaptadores para seus plugs elétricos - como é que eles chegaram até aqui sem isso?

O mais chato é a gente ficar olhando todos os caminhões que tivemos um trabalho danado para ultrapassar passando de novo para ficar à nossa frente. Retomamos a jornada numa estrada melhorzinha, mas que também foi piorando conforme avançavamos. E, meio inesperadamente, subimos dos aproximadamente 600-700 m. de altitude do lago Malawi para quase 1.700 de serra. Mas foi uma subida relativamente suave, só percebemos pela queda da temperatura seguida de consulta ao GPS.

Nese trecho também conseguimos acrescentar uma lembrança desnecessária a nossa experiência no Malawi: uma multa de trânsito por excesso de velocidade. Não tivemos a menor chance: ultrapassei um ônibus que estava nos segurando há algum tempo, e exatamente quando voltamos para nossa pista depois da ultrapassagem cruzamos a placa de 50 km/h. Fomos parados, e o policial nos informou que estávamos a 65 km/h e por isso a multa seria de MWK 5.000 (imaginamos que haja proporcionalidade entre a velocidade e a multa)|.

A forma exata como ele informou o valor da multa foi: "a multa é de MWK 5.000 e eu lhe darei um recibo". Faltou muito pouco para perguntarmos "e se não precisarmos de recibo?". Mas achamos que não valia a pena arriscar: esse valor corresponde a aproximadamente US$ 7,00! Deixa prá lá. Pagamos e saímos na caçada ao resto do pessoal que havia se distanciado bastante. Só o Julian, fiel escudeiro na van, parou e esperou por nós. É um semtimento bastante confortante saber que sempre há alguém que ou está diretamente atrás ou nos alcançará rapidamente em caso de problemas.

Não foi fácil alcançar o grupo: a descida da serra de volta para o lago Malawi é uma estradinha super sinuosa, mal pavimentada e, claro, com caminhões! Mas aí chegamos numa curva e tivemos uma vista do lago que valeu cada minuto da descida. Pena que não havia como parar para fotografar. E no fim esse trecho foi muito cansativo porque o Darryl não encontrava um local para pararmos as nove motos mais a van para o almoço. Acabamos andando mais de duas horas antes de poder parar. Haja bunda para aguentar tanto tempo em cima da moto!

O resto foi uma motocada tranquila até chegar ao hotel.

Agora já atravessamos três países (Botswana, Zâmbia e Malawi) onde a língua inglesa é oficial, em complemento à língua nativa. No caso de Zãmbia pode-se dizer que inglês é a única língua que permite ao próprio povo local se comunicar adequadamente: há mais de 70 línguas diferentes no país, associadas às diversas origens tribais da população. Ficamos nos perguntando até que ponto os cidadãos desses países podem se considerar realmente independentes e integrantes do país se nem uma líingua própria comum existe para uní-los.

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